Monday, November 18, 2024

CRÍTICA: Abigail, de Matt Bettinelli-Olpin e Tyler Gillett

A ideia era suficientemente aguçada, mas o resultado não tem dentes. Um grupo de criminosos que não se conhecem é reunido por uma organização criminosa para o rapto de uma menina e subsequente vinte e quatro horas numa velha mansão resguardada enquanto o resgate é negociado. A captura é cumprida com eficiência, mas durante a espera a presa revela-se o predador. Não é ela que está fechada com eles, mas eles que estão fechados com ela.

Vinte minutos de tempo morto cumprem a função de dar a conhecer os personagens e a sua eventual hierarquia qualitativa. Decapitado o primeiro ao fim de meia hora, o segundo é despachado pelo mesmo vento que entreabre portas e desfere um único golpe fatal. Desorganização, acusações soltas e a revelação, aos 45 minutos, de que a menina titular é vampira.

Abigail não venera o folclore nem a mitologia, limitando-se a brincar com a ideia de um grupo de adultos trancado com uma assassina de palmo e meio. A força sobre-humana de Abigail varia conforme as necessidades de cena para cena e, apesar de algum paleio que a identifica com o mais eficiente assassino do crime organizado para o qual trabalham os próprios raptores, nunca mais se comporta com a habilidade das duas mortes que abriram as hostilidades (e das quais ela pode nem ter sido responsável). O jogo do gato e do rato prossegue com ganhos e perdas para ambos lados, porque uma longa metragem tem de ser esticada. Umas vezes Abigail atira humanos à distância, outras nem consegue soltar-se quando a agarram pelos pulsos; uma vezes arromba portas de metal, outras uma porta de madeira fechada à pressa é suficiente para obrigá-la a compreender a complicada engrenagem de uma maçaneta de rodar; depois de a verem sobreviver a um tiro na testa e a seis no peito à queima-roupa, os humanos decidem afiar as pernas de uma cadeira (a eterna estaca que atravessa o coração) porque a madeira vence o chumbo, apesar de não terem um alvo imóvel num caixão nem um martelo que ajude as estacas a atravessar-lhe as costelas, é tão de cavalo para burro como o guião.

Porque Abigail tem aparência infantil, a raptora-protagonista inventa-lhe a necessidade de aprovação parental, uma conjectura sem suporte factual que se prova verdadeira por conveniência do argumento, quando na realidade Abigail podia ser mais velha do que uma trisavó. Mas estamos perante um triste caso de psicologia de pacotilha e a frase-chave é perguntar à filha (a assassina eficiente da organização criminosa para a qual todos trabalham) quantos inimigos do pai (o líder da organização) acha que terá de matar até este a amar novamente. Isto perguntado por alguém que desconhece a idade de Abigail ou a existência de parentesco entre ela e o líder da organização. Se a narrativa primasse pela menor originalidade, seria Abigail a líder da organização e a sua imagem a melhor camuflagem.

Outro dos artifícios idiotas do enredo foi aprendido com a saga Twilight, segundo a qual um vampiro acabado de transformar é mais forte do que um vampiro veterano. O que é absolutamente imbecil, porque nenhum vampiro teria incentivo para criar outros se fosse incapaz de controlá-los. E, sim, isso acontece aqui, com os vampiros mais recentes a revoltarem-se contra os mais antigos. E já nem vou mencionar que, entre os humanos, uma dispara sobre outro para que se controle e este é compreensivo, apesar de ser maior, mais agressivo e ter sido baleado impunemente. De resto, a realização é competente e as interpretações também. Melissa Barrera, depois de ter sido despedida da saga Scream por tweets pró-Palestina, volta a protagonizar para os mesmos realizadores de Scream V e VI (que não iam ser os realizadores de Scream VII) mas a rodagem já estava concluída à ocasião da celeuma, pelo que é uma incógnita se teria sido contratada mais tarde.

Abigail 2024

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